05 setembro, 2008

Livros : Férias 2008

Quando viajo nas férias não consigo ler grande coisa. Mas se me fico cá pela terrinha, tenho alguma tendência para passar as férias a ler: é ao pequeno-almoço, é na praia, é à hora da sesta, é depois à noite até cair para o lado de sono.

Nestas duas semanas de férias, despachei uns quantos dos livros que tinha para ler (segundo o meu Anobii ainda ficaram na pilha 49) e, apesar de alguma dispersão estilística, posso dizer que gostei de tudo o que li (ou sou pouco exigente ou sou muito bom a escolher).

Clássicos

Cadernos do Subterrâneo
Fiódor Dostoiévski

Até há relativamente pouco tempo não queria sequer saber dos clássicos da literatura. Tal como na música e no cinema, a minha postura era claramente olhar para o presente e (de preferência) para o futuro. Por influência dos media e de alguns amigos de bom gosto, comecei a ler alguns dos clássicos Russos (Tchékov, Tolstoi, Gogol), e agora confesso-me algo viciado. No entanto sinto que não tenho ponta de legitimidade para escrever sobre estes senhores enterrados há muitos anos, e que muita gente parece idolatrar. Este foi o meu primeiro Dostoiévski e fiquei desconfiado que não era uma obra menor só em tamanho. A 1ª parte pareceu-me um bocadinho chata, mas gostei muito da 2ª. Terei evidentemente de me lançar em projectos mais ambiciosos...

Menina Else
Arthur Schnitzler

Este é Austríaco em vez de Russo, e é um bocadinho mais recente. Contemporâneo e amigo de Sigmund Freud, a menina Else do título é uma rapariga de 19 anos um pouco neurótica (estou a ser simpático) que se encontra de férias no meio da alta classe, que sofre dos problemas de grande parte das pessoas da mesma, e que se encontra mediante um dilema moral que a levará a inevitável tragédia. Dado ser bastante arrojado para a época (1924), não apenas pela critica social, mas também no que concerne à representação da libido feminina, este livro foi proibido pelo poder fascista alguns anos depois da sua publicação. Tendo sido um dos primeiros livros a expor o que vai na mente da sua personagem de forma não linear (à semelhança do que se passa nas nossas cabecinhas), lê-se de um só fôlego e deixa muita vontade de ler mais obras do autor.

Contemporâneos

Swung
Ewan Morrison

Este é o primeiro romance deste Escocês - que anteriormente tinha publicado uma recolha de contos intitulada The Last Book You Read - e por esta amostra parece-me que temos escritor para o futuro (lá estou eu...). David é um actor falhado e divorciado que trabalha numa pequena cadeia de televisão e que sofre de impotência. A sua companheira Alice é uma artista plástica à deriva, que acaba por trabalhar na mesma cadeia de televisão que David, há falta de melhor para fazer. Swung acompanha-nos nas investidas que ambos fazem pelo mundo do swing, na tentativa de encontrar uma cura para o pequeno problema do protagonista. Com conteúdo bastante explicito, é no entanto a densidade psicologica das suas personagens que lhe confere um toque de realidade e uma profundidade que o faz sobresair. Mesmo não tendo ficado totalmente satisfeito com o final, temos nitidamente autor a seguir e vou já tratar de encomendar o seu novo livro - Distance.

La Sombra del Viento
Carlos Ruiz Zafón

Por mais que resista a ler "livros de sucesso", era mais ou menos inevitável ler este bestseller Espanhol. A ideia base de um miúdo de 10 anos que é levado ao "Cemitério dos Livros Esquecidos" pelo seu pai, onde pode escolher um único livro entre os milhares e que acerta em cheio num título de um romancista obscuro e misterioso chamado Julian Carax, é claramente muito apelativa a qualquer pessoa que tenha amor pelos livros. A partir desta ideia base, o autor faz-nos avançar com mestria para a frente e para trás nos anos e na cidade de Barcelona, enquanto se descobre a história do livro e do seu autor. É verdade que segue um pouco o modelo de sucesso Americano, mas está recheado de personagens que só poderiam ser Espanholas e o negrume dos anos da guerra civil e do fascismo, confere-lhe um toque único. Completamente impossível de largar...

No One Belongs Here More Than You
Miranda July

Realizadora de Me and You and Everyone you Know, Miranda July é aquilo a que se chama uma artista multifacetada: performance, música, escrita, interpretação são outras das artes a que já se dedicou, e tudo me leva a crer que não ficará por aqui. Esta primeira colecção de contos, sofre um pouco do mesmo problema do seu filme de estreia: se por vezes consegue ser totalmente brilhante no seu humanismo (pontualmente fez-me lembrar o saudoso Raymond Carver), por outras também parece ter um pouco de tendencia a fazer coisas estranhas só para parecer diferente. E depois quase todas as suas personagens são pessoas solitárias e desenquadradas socialmente, o que sendo interessante se torna um pouco cansativo. Mesmo assim contém, sem qualquer dúvida o melhor conto que li recentemente: Something That Needs Nothing é mais do que suficiente para merecer o desvio...

Tugas

A Carne de Deus
Afonso Cruz

Guitarrista dos Soaked Lamb (de que o LR vos falou por aqui) e tendo sido um dos colaboradores do saudoso Baixa Autoridade, este livro de estreia de Afonso Cruz foi uma grande surpresa. Primeiro volume das aventuras de Conrado Fortes (um tipo desempregado e baixinho mas com um grande poder de atracção) e Lola Benites (uma mulher sofisticada e sensual de boas famílias), envolve-os numa trama alambicada e picaresca que parece conseguir envolver todos os credos e cultos do mundo numa série de assassinios. Apesar de ser mesmo um livro de aventuras, o autor deixa bem transparecer o seu gosto pelo estudo comparativo das diversas religiões. Tanto as personagens principais como a sua interacção estão muito bem conseguidas, o humor está quase sempre presente, e só posso mesmo ter ficado viciado. Há muito que não me divertia tanto com um livro. Venha daí o próximo...

o remorso de baltazar serapião
valter hugo mãe

apanhei este senhor a fazer a apresentação do seu novo livro (o apocalipse dos trabalhadores) na fnac e fiquei suficientemente curioso para experimentar. decidi no entanto começar por este, o seu livro anterior, e vencedor do prémio saramago de 2007. passado na idade média feudal, apresenta-nos a vida do tal baltazar que casa com a mulher dos seus sonhos, para depois a estrupiar em ataques de ciúme doentio. não é fácil de ler, tanto pela linguagem a atirar para o antigo, como pelo conteúdo realista e brutal, mas foi uma autêntica revelação. não tenho a menor dúvida que deste conjunto foi o livro de que gostei mais, e já cá canta o apocalipse para ler em breve...

3 comentários:

J. Maldonado disse...

São sugestões interessantes... :-O
Logo que possa, hei-de ler alguns dos livros que mencionaste...

Ervi Mendel disse...

Eu não tenho quaisquer saudades do "Baixa Autoridade"

PS: Bom esforço!

Anónimo disse...

Não és o único, ervi. Não és o único.