17 novembro, 2008

Livros : Livrólicos Anónimos

Mais uma vez a falta de tempo não me deixa dar o destaque ideal aos livros que vou lendo e gostando. "Se este gajo não tem tempo, como é que consegue ler tanto livro?" poderão perguntar e com todo o direito. O facto é que aproveito todo e qualquer bocadinho de tempo que tenho para o fazer! Ele é pequeno almoço, casa de banho, etc. E se por acaso me encontrarem na rua, é capaz de não valer grandemente a pena chamarem por mim porque o mais provável é estar a andar, ler e ouvir música ao mesmo tempo! Digam lá se isto não muda o vosso conceito de alienado!

Numa tentativa de mudar um pouco a falta de tempo, estou a experimentar escrever estas linhas no meu telemóvel a bordo de um autocarro. Se a coisa correr bem, e não ficar sem saldo no cartão, é bem possível que passe a aumentar a frequência das postas. Vamos lá a ver.

Despachando esta introdução que já vai longa (se calhar as viagens de autocarro dão-me para a verborreia): seguem os livros recomendáveis que li entre as férias e aquele de que lhes falava há dias...

The Second Plane
Martin Amis

Este pequeno livro recolhe um conjunto de textos que o autor publicou um pouco por toda a imprensa Inglesa entre 2001 e 2007, e todos ligados directa ou indirectamente ao 11 de Setembro. Temos artigos de opinião, criticas, dois contos e o famoso artigo resultante do acompanhamento que fez à vida de Tony Blair nos seus últimos dias como primeiro ministro.

Como qualquer recolha deste tipo, existem textos que me dizem mais do que outros: o conto sobre os últimos dias de Muhammad Atta, a critica ao United 93 (provavelmente o texto mais emotivo do livro, em contraste claramente intencional com o tom do filme), e o referido sobre Blair foram para mim os pontos altos. Mesmo se alguns dos textos exigem um nível de conhecimento dos assuntos Árabes, nitidamente superior ao que a minha modesta cultura possui, o prazer que a escrita de Amis me proporciona leva-me a gostar até daquilo que não percebo.

The Weight of Numbers
Simon Ings

Deste autor já tinha lido dois livros (Hot Head de 1992 e Hotwire de 1995) que se inscreviam claramente no boom cyberpunk de finais de 80 inícios de 90. Guardo boas memórias de ambos (principalmente do primeiro), mas tenho a impressão que não transcendem o género em que se enquadram. Um excelente acolhimento critico (que também se verificou por cá quando da edição nacional) levou-me a ler este que se inscreve num campeonato completamente diferente.

Uma série de personagens perdidas ao longo do século XX servem de motivo para um retrato de época muito abrangente. Por aqui passam elementos tão dispares como o programa espacial dos EUA, a psiquiatria, o tráfego humano e acompanhamos alguns momentos históricos na pele das personagens que o vivem. Destes, o mais impressionante (e não apenas pela proximidade histórica ao nosso pais) é a descrição de Moçambique em plena guerra civil após a libertação do pais.

Sendo um pouco ambicioso demais para o seu próprio bem (a multitude de personagens e momentos deixou-me por vezes um pouco baralhado), está impecavelmente bem escrito e é muito original. Dada a sua complexidade estou a considerar seriamente uma segunda leitura.

Northline
Willy Vlautin

Tal como The Motel Life de que já vos tinha falado por aqui, este 2º livro de Vlautin também fala de pessoas com vidas extremamente infelizes. Neste caso a de Allison, uma rapariga jovem que sob a influência de um namorado abusivo e white trash de extrema direita, bebe regularmente até ao esquecimento. Pouco depois do início do livro decide começar uma nova vida num novo sítio e tentar alterar o seu sofrimento constante...

A escrita de Vlautin continua seca e bonita, e ainda temos direito a uma homenagem muito tocante ao recentemente falecido Paul Newman, que faz o ideal masculino da protagonista e com quem tem diálogos imaginários muito divertidos. Um hino à esperança e à persistência da raça humana que vem confirmar um excelente autor que só podia ser Americano.

I Play the Drums in a Band Called Okay
Toby Litt

Retrato de uma banda rock de médio gabarito chamada okay, e cujos membros usam doenças venéreas como nomes artísticos (Clap, Syph, Mono e Crab), é apresentada pelo autor como uma novela em histórias curtas, que percorre a totalidade (ou quase) da sua carreira. Apesar da previsibilidade do circo do rock & roll (drogas, alcool, groupies, divergências artísticas, etc.), consegue ser bastante humano e apresentar algumas preocupações que ocorrem aos restantes dos mortais e não se limitam aos deuses do rock.

Sendo do Toby Litt, só poderia estar muito bem escrito, mas ainda não é desta que ele faz um livro que eu ache verdadeiramente genial (aliás fica uns furos abaixo de algumas outras obras da sua autoria), mas se forem suckers por este tipo de história como eu, irão certamente dar o vosso tempo como bem gasto.

We Are Now Beginning Our Descent
James Meek

Autor de um dos meus livros favoritos de 2006 (The People's Act of Love saído em 2005), Meek é um jornalista premiado com artigos sobre Guantanamo Bay ou o Iraque. É precisamente inspirado nessa experiência que coloca no papel principal desta nova novela um jornalista de guerra, colocado no Afeganistão em Outubro de 2001. Divorciado e emocionalmente instável, é aí que conhece Astrid, também ela jornalista, e com quem enceta uma relação que o vai levar à volta do mundo.

Retrato muito fiel dos nossos tempos, coloca-nos perante um conjunto de questões morais de forma brutalmente eficaz (particularmente inesquecível é uma cena de jantar entre amigos em Londres), levando-nos a questionar até que ponto o mundo ocidental representa o bem. Não sendo tão devorável como o livro anterior, confirma Meek como um autor a seguir muito de perto.

Efeito Borboleta e outras Histórias
José Mário Silva

Coordenador da secção de livros do Expresso e colaborador permanente da revista Ler, José Mário Silva já nos tinha trazido em 2001 um livro de poemas intitulado Nuvens & Labirintos. Este Efeito Borboleta é uma recolha de pequenas narrativas (publicadas maioritariamente no suplemento DNA do Diário de Notícias), que juntam com sucesso o melhor da short story com um elevado poder poético.

Totalmente impossível de enclausurar em termos de estilo ou tema, o autor consegue com uma mestria de fazer inveja, pintar autênticos quadros a partir de meia dúzia de palavras. Também muito abrangente em termos de influências, é particularmente tocante a homenagem prestada a Raymond Carver em Quatro Pregos. Mais uma revelação nas letras Portuguesas a não perder...

Man in the Dark
Paul Auster

Como vem sendo hábito nos seus livros mais recentes, Auster escolhe mais uma vez um homem de alguma idade como protagonista, desta vez preso a uma cama na sequência de um acidente de viação que o obriga a estar imobilizado. Sofrendo de insónia e para passar o tempo, Brill conta-se a si próprio uma história em que os EUA estão em plena guerra civil.

Apesar de um pouco desequilibrado e de esta história paralela parecer um pouco inútil, a segunda parte do livro em que Brill revê traumas e felicidades do seu passado na presença da sua neta representa Auster no seu melhor e salva perfeitamente a obra. Pode ainda não ser o seu novo livro ambicioso porque espero desde The Book of Illusion, mas é um grande pequeno Auster.

2 comentários:

Anónimo disse...

Man, que maratona!

E que inveja!

Um abraço,

JEF

Bruno Taborda disse...

E olha que estes são só os que eu achei recomendáveis. Ainda li mais 2 ou 3...